15 de junho de 2013

Eu sou a única flor-borboleta

Eu lembro perfeitamente do meu primeiro vestidinho, ele era vermelho de alcinha, bem solto. Nunca tive um vestido igual, mas isso pode ser porque, depois desse, tive um hiato de pelo menos uns 13 anos antes de usar outro.
Como já tentei demonstrar no post passado, eu era uma criança maravilhosa, no sentido de que tinha algumas ideias bem fortes sobre a vida. De acordo com a minha mãe, ela tentou me fazer usar esse vestido aos 4 anos e eu me recusava fortemente. Depois de muito insistir, eu falei "tá bem, me dá essa porcaria" (nessas palavras exatas) e usei o bendito vestido por três dias seguidos.
Quando criança, eu já não gostava do meu cabelo, por ser do tipo bombril. Acho que a única vez em que consegui gostar dele foi quando a empregada teve a ideia de fazer milhares de trancinhas nele. Talvez seja por isso que até hoje eu adore tranças.

Mas o negócio é que, quando criança, eu não ligava muito para a aparência. Eu tinha uma certeza, vinda de não sei onde, de que no futuro eu seria bonita, então não precisava me preocupar agora. Lembro de uma vizinha tranquilizando a minha mãe, que queria que eu trocasse pra uma roupa mais arrumadinha antes de ir com meus amiguinhos pra casa da avó deles, dizendo que quando eu fosse mais velha eu teria mais vaidade. Na época, eu achei essa palavra muito feia e não queria tê-la nunca. Hoje em dia, eu continuo achando uma palavra feia e não quero tê-la.
Essa consciência do que as pessoas consideram fashion é algo letal. No Brasil, eu estudo com uma turma majoritariamente composta por meninos e me sinto extremamente confortável em ir pra aula usando camisetas do Pikachu e calças jeans da época em que tinha a barriga gigante por causa do cisto. Meninas, não importa a idade ou o país, são uma coisa perigosa.

O que acontece aqui é o contrário da minha situação em casa - a maioria gritante das pessoas na minha sala são garotas. A minha faculdade é de garotas. As minhas professoras são garotas. As únicas pessoas a quem já pude chamar de "oppa" foram o SHINee e só consegui fazer isso porque sabia que eu era mais uma na multidão pra eles - a falta de uso me faz ter vergonha de usar a palavra.
Uma vez eu disse no Twitter que todas as minhas amigas são homens pra mim. Prefiro pensar assim porque a minha experiência com amigas garotas nunca foi boa, fora a Lara. Eu me sinto, e sempre me senti, mais confortável entre meninos. O que não é uma opção para mim por aqui.

Deixando pra lá toda a minha história de vida, a Coreia do Sul é um país conhecido pela alta taxa de suicídio dos seus alunos de ensino médio. Como eu aprendi neste site, um dos motivos disso é a pressão pela beleza. Nas palavras de Fred, "todas as coreanas de middle school são feias, mas todas as adultas são lindas. O que acontece nesse intervalo?". A resposta seriam plásticas, tratamentos estéticos e talvez a compra de roupas que elas não podiam usar quando eram novas. Nas outras cidades é um pouco diferente, mas aqui na capital, a grande maioria das mulheres são lindas, bem vestidas e magras. E de quebra elas tem poucos pelos no corpo e não suam. É de deixar qualquer uma com inveja, né?
Desde que cheguei aqui, é isso o que sinto - inveja e baixa auto-estima. Eu tenho as coxas grossas, uma bunda "brasileira" e, como sou uma pessoa normal, gordurinhas mal-localizadas. Também acho que meus ombros são largos demais, minhas sobrancelhas são um caos e estou voltando a odiar o meu cabelo à medida em que ele volta ao normal, já que não posso fazer aqui o mesmo tratamento caro e agressivo que faço no Brasil.

O que eu queria contar neste post e estou enrolando já faz extensos dez parágrafos são episódios que aconteceram aqui comigo, então por favor não se preocupem comigo quanto à auto-estima. É sério, eu me adoro. Aqui no meu apartamento, sentada no chão, só de pijama, eu me adoro. Só preciso trabalhar em continuar com esse sentimento do lado de fora de casa.

Então, acontecimento número um - eu cortei o cabelo! Fui num salão aqui na rua mesmo, no terceiro andar de um prédio que também tem um café com a pior internet da Coreia e um escritório de advocacia. Ninguém falou um pingo de inglês comigo, foi tudo baseado em pouquíssimo coreano e muita mímica. A moça cortou o meu cabelo sem lavar (eu sou o tipo de pessoa que, quando resolve cortar o cabelo, para de lavar uns 3 dias antes, pra aproveitar que já vai receber tratamento profissional), então ela perguntou se eu iria querer e, claro, aceitei.

Quem lavou não foi a mesma moça, e sim um coreano com calça justa rosa e cabelo loiro preso num daqueles rabo-de-coqueiro típicos coreanos. Não sei se todo mundo faz isso, mas eu adoro fechar os olhos e me deixar levar pela ótima sensação de ter alguém lavando o seu cabelo pra você. Aliás, pequeno detalhe, as mãos desse cara eram hiper macias. Não sei o que ele passa, mas eu quero uma caixa inteira.

O problema foi na hora de secar. Ele tava com uma cara que eu só posso expressar como nojo ou muita má vontade. Enquanto secava super devagar, ele ficava parando pra fazer "argh" pra alguma mecha do meu cabelo e de vez em quando tirava um pedacinho de caspa. Eu não sei se era a caspa, se era a raíz do meu cabelo, que já está voltando ao bombril ou o quê. Ele nem estava embaraçado, a moça tinha penteado com mó cuidado.

Chegou a um ponto em que outra mocinha veio e secou junto com ele, depois mandando ele deixar só ela secando. Diferente do cara, ela foi hiper rápida e me perguntou se eu queria passar chapinha. Ela também era super fofa e me chamou de unnie! Eu estava muito chateada e triste, mas ela foi tão legal que eu me re-animei. E quando ela terminou, o meu cabelo ficou tão bonito que eu não pude deixar de sorrir e agradecer!

Nosso segundo caso aconteceu a dois dias atrás, quando eu resolvi sair às compras. Recentemente eu tirei todas as minhas roupas de frio do armário e percebi que praticamente não tenho nada para usar no verão, então estive tentando fazer Fred sair comigo para comprarmos roupas pra mim. Como ele ficou enrolando pra não ir, resolvi ir eu mesma!
A área perto da minha faculdade é conhecida pelas lojas voltadas para garotas universitárias - ou seja, jovens sem muito dinheiro, mas eu não fui comprar lá porque queria passar numa lojinha de k-pop e comprar os CDs que a Sissel e a Lizzy me pediram. Eu imaginei que não seria difícil achar roupas perto desse lugar, afinal, é um bairro inteiro conhecido por ser uma área de compras.

Só que eu conheço bem a área perto da Ewha, mas não sei de nada de Myeondong. Antes de vir para cá, encontrei o tumblr de uma menina que já tinha estudado por aqui e ela deu a dica que nunca esqueci, "na Ewha, nunca compre na rua principal, porque lá são as lojas mais caras". Mas não tenho conselho nenhum para Myeondong! E todas as lojas pareciam hiper caras e chiques.

Depois de fazer proezas tipo me perder, encontrar um shopping underground que se estende até outro bairro e ouvir brasileiros passando e não falar com eles, eu resolvo entrar em um shopping qualquer só pelo prazer do ar condicionado. Como mal tenho roupas, vim usando a camiseta do EKLES, um clube da Ewha, um short meio desgastado pelo uso e chinelas havaianas (que eu comprei no Brasil, ok?).
Pra minha sorte, tinha uma loja fazendo promoção e as roupas pareciam ser legais! Só que era uma loja bem minúscula, tipo nem 4 metros quadrados direito. Aí eu vi uma placa indicando que eles tinham a mesma loja no 5° andar e eu resolvo ir lá.

Então vou alegre e saltitante até o elevador mais próximo. E aí é que vem a coisa que me deixou chateada. Quando as portas se abriram, tinha um monte de adultos de terno e vestido. Tipo, todo mundo bem empresarial. E eu lá. Única estrangeira. De short e camiseta. E chinelo.
Sabe quando todo mundo te olha dos pés à cabeça e dá pra ver que ninguém te considera pertencente àquele lugar? Foi o que eu senti. A minha vontade era sair do shopping na mesma hora, mas me armei de coregem, entrei no elevador e saí sozinha no quinto andar. O ambiente nesse andar era ainda mais chique que o térreo e eu me senti oprimida. As roupas não eram baratas como pensei e acabei não comprando nada.

Eu estava me sentindo feia e desarrumada. E me senti ainda pior quando passou uma coreana com uma roupa parecida com a minha, só que nela parecia algo super "despojado" ou seja lá como se fala. Nela estava melhor.
Não sei como os outros intercambistas se sentem, mas às vezes eu sinto raiva dos coreanos. Porque eles sempre parecem melhores que a gente. Em tudo. Claro que não são, claro que ninguém é melhor do que ninguém. É um sentimento que aparece só quando estou me sentindo mal. Porque eles se escondem atrás de suas camadas de maquiagens, cirurgias, roupas chiques.
Quando ainda estávamos no hostel, uma professora americana contou pra gente que um amigo dela tentou namorar coreanas, mas nada durava muito tempo. "Porque elas são tão lindas por fora quanto são feias por dentro".

Não é que todos os coreanos sejam pessoas horríveis ou algo assim. E geralmente são gentis com estrangeiros, mesmo que às vezes dê uma impressão de gentileza falsa.
É só que meninas, não importa a idade ou o país, são uma coisa perigosa. Eu nunca me dei bem com elas.

Ouvindo: Fantasy - Jolin Tsai

PS: Comprei as três roupas mais lindinhas de toda a face da Terra depois disso. Achei uma loja barata que vende peças simples, de uma cor só, e comprei uma saia, depois uma moça muito fofa me convenceu a entrar numa loja e me apaixonei por um casaquinho e antes de chegar na loja de k-pop vi um vestido de 20 reais do jeito que eu gosto.

3 comentários:

  1. Que tenso esse lado dos coreanos, eu ein! Eles são muito obcecados com beleza e estética em geral! Ok que ser magro e o caramba todo é bonito, mas esse padrão obcecado que eles adotam é RIDÍCULO. Pelo menos tem alguns que salvam, né? força aí, Vivi! rumo as boas experiencias!

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  2. "Lembro de uma vizinha tranquilizando a minha mãe, que queria que eu trocasse pra uma roupa mais arrumadinha antes de ir com meus amiguinhos pra casa da avó deles, dizendo que quando eu fosse mais velha eu teria mais vaidade." Por que isso me soa tão familiar? Tantas vezes eu também ouvi isso... - e ouço até hoje [principalmente pq tenho que fazer minha sobrancelha ^^;]
    Vi um documentário dia desses comentando o motivo das coreanas quererem sempre se tornarem mais bonitas fazendo cirurgias plásticas, e uma das razões - que percebi - é que elas não recebem a atenção/carinho/elogios dos pais quando crianças, e já injetado nessa cultura elas crescem já pensando em vaidade. No final, acabam que ficam com um rosto 'padronizado' e mais difícil pra minha pessoa de diferenciá-las.
    Tbm acho que é uma questão de auto-estima, mas tbm tem a ver com o fato de vc se sentir bonita ou usar algo que vc goste [como uma camisa, bijuteria ou maquiagem].
    É bom ver que você está aos poucos conseguindo superar as dificuldades por aí <3 Vivi lutando o/

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  3. Apesar do teor um pouco triste, eu achei esse texto muito bonito. Eu realmente sinto muita falta de ouvir tuas histórias, e o Cookie meio que quebra o meu galho.

    Mas sabe? Eu não acho que meninas sejam de todo perigosas. Eu só acho que a maioria dela infelizmente sucumbe à realidade que o sistema quer que elas sucubam. E isso é bem triste.

    Por causa das minhas amigas meninas, eu acabo entrando em contato com um pouco desse universo. São sempre mil tipos de maquiagens e tratamentos, e todas elas falam disso como se fosse normal, sem pensar no trabalhão que dá. Bom, pelo menos pra mim é um trabalhão. Nessas horas eu agradeço por ser menino, porque eu jamais teria paciência.

    E você por não ter paciência se torna ainda mais especial do que já é. Essa é a Vi!

    Estou sempre torcendo por você ~

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